sexta-feira, 30 de novembro de 2007

[TIRINHA] Contos da Inexistência

Mais um trecho de uma conversa no MSN dramatizado.

Mais uma co-autoria involuntária (desta vez creditada na própria tira).

A idéia dos balões estilizados foi sugerida pela Luciana Ribeiro, minha amiga carioca, futura escritora de renome nacional e internacional (entre outros atributos que os antigos leitores deste blog hão de se lembrar (ou não)).

E, Hel, antes que você diga qualquer coisa sobre a cor do cabelo, a resposta é: porque eu prefiro ele assim (e também porque o efeito ficou mais interessante com ele vermelho).


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Comentários:

=] "futura escritora de renome nacional e internacional..." Hahahahahaha, muito obrigada pela parte que me toca! E olha, não é porque a idéia foi minha não, mas ficou boa... =] Adorei. ;] Beijo!

Luciana | 05-12-2007 18:36:38
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AAAAAAAAAAAAAAHAUIHAUIAHIUAHIUAH! caraca, não era pra mim participa de tirinha nenhuma ¬¬ HAAUIOHAIHAUAHOUAIOHH!, mas não posso negar, sou eu ahuIHAOhaAUaiuHAuah! o cabelo fico igual, com tudo essas voltinhas ahiuAHOIUAhauiHAahu!, menos a cor HAUIhoauia, mas tu jah explico. Bah, não paro de rir! Oo'' Pow, campanha é phoda hein. Bah vo para HAUIHAOUAHAUIAH! :B

HEL | 30-11-2007 20:44:50

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

[TIRINHA] Contos da Inexistência


Se a da semana passada foi escrita a 4 mãos, a desta semana contou com três pares delas. Bom... mais ou menos... Tive a idéia de fazê-la quando meu amigo Lucas me lembrou de algumas das frases antológicas de um amigo nosso, o Glauber (por isto o TM ao lado das falas dele). Assim, seria injusto da minha parte caso não creditasse os dois como co-autores dela.

Ah, e ela é um presente de aniversário adiantado, já que o Glauber aniversareia na próxima semana (dia 30/11). Portanto, já deixo aqui meus parabéns a ele!

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Comentários:

Wolv, valeu pelos parabéns!! Sempre com boas sacadas. []s

Gobi Covil | Email | Homepage | 08-12-2007 16:01:09
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Hehehehehehehe! De todas as pessoas que eu conheço, você certamente é uma delas! Muito bom. =]

Luciana | 27-11-2007 23:03:08
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HAHAHAHAHAHAHA! Adorei a primeira, a segunda e a terceira frase HUAIHOUAIHAIHAIU! bjO wolv \o\

Heluza | 26-11-2007 13:10:41
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hehehehe, essa ficou realmente boa... valeu pelas referências!

Lucão | 24-11-2007 21:31:15

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

[TIRINHA] Contos da Inexistência


Sim, quando ninguém sequer esperava, eles estão de volta. Em caráter esporádico, é verdade, mas estão.

A origem desta tira é curiosa, pois seu roteiro nasceu praticamente pronto durante uma conversa sobre filmes com um amigo meu, o Cilon, conhecido na internet como Ceres ou simplesmente C. Portanto, pra quem ainda não sacou o óbvio, ela foi escrita a 4 mãos, literalmente.

Esperamos que apreciem esse retorno um tanto súbito.

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ADENDO: Pra quem ficou curioso em saber o que está escrito na camiseta do C, segue abaixo uma ampliação do desenho pra saciar sua curiosidade:



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Comentários:

O Ceres parece que saiu diretamente dos Simpsons! =P Você devia ganhar a vida com isso, é muito bom. Sabe que eu não imagino você sendo tão alto quanto você é? (Me toquei que você é realmente alto vendo a tirinha.) A conversa aconteceu no MSN? Teria sido legal se você tivesse feito uns balões estilo janelinha de MSN. =P

Luciana | 21-11-2007 21:30:17
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Espero que este seja o retorno. Curti os traços. Abração

Glauber | Email | Homepage | 17-11-2007 20:53:52
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Voltando à velha forma? Ou foi um momento esporádico? O fato é q eu realmente estava sentindo falta das tirinhas... que as boas idéias continuem lhe rodeando!

Lucão | Email | 16-11-2007 22:28:29
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Gostei gostei. Acho que já vi esse filme. Vou pesquisar sobre ele pra ter certeza depois. Mas enfim, que bom que voltou com as tirinhas. Sempre é bom ter do que rir por aqui. ^^ Beijo Wolv.

Heluza | 16-11-2007 21:36:55

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

[CONTO] Migalhas da Desconstrução

(Texto originalmente escrito em 15/07/2007)



Punhos fechados hermeticamente. Rocha densamente sólida. Maxilar e dentes esmigalhados. Chuvisco de sangue. Crânio fraturado. Morte. Terra quente que seca. Poeira que sufoca. Raiva que turva. Arrependimento que tarda. Culpa que corrói. Medo que subjuga. Olhos que varrem. Suor que escorre, pinga, queima, empapa. Calor. Sinapses frenéticas. Pensamentos dispersivos. Idéias fugitivas. Palpitação. Tremor. Soluções escorregadias. Ruídos enervantes. Ansiedade. Embrulho estomacal. Cabeça latejante. Destruição do ser. Mão escandalosa. Deus piedoso. Toque frio. Apodrecendo. Esconder. Escavar. Arrastar. Enterrar. Consciência pesada. Tormentos. Pesadelos. Perseguição. Lágrimas. Desespero. Unhas cravadas em pele. Autopunição. Caixa escondida. Arma. Metal frio. Têmpora. Pressão. Gatilho...

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Comentários:

Bom, de início me senti assistindo Kill Bill (ainda tenho que conversar com você sobre Kill Bill, e vai ser esse um nossos assuntos da primeira conversa no Google Talk, que tal?), depois me senti em mim mesma, em como foi minha vida nesse ano de 2007. Mas parei em "Desespero." Não cheguei a cravar unhas em lugar algum. Mas ótimo texto, repleto de sensações. Repleto de coisa humana.

Luciana | 21-11-2007 21:39:10
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Por falar em têmpora, pressão e gatilho, tu ainda tem aquela HQ que eu fiz?

Aélsio | Email | 15-11-2007 20:51:40

[CONTO] Crescimento

(Texto originalmente escrito em 15/07/2007)



Eu caio na terra fofa e cresço, aprofundando minhas raízes, cresço, brotando pequenos e finos galhos, cresço, anel sobre anel, cresço, ficando maior e mais vistosa, cresço, adensando minha fortaleza, cresço, exibindo minhas novas folhas, cresço, deixando a brisa acariciá-las.

A brisa se torna vento, o vento ventania, e perco algumas delas. Sinto-as planarem, sinto uma delas chocando-se contra a asa de um pássaro em pleno vôo. Sinto o efêmero macio de suas penas, que logo seguem caminho incerto. Sinto-me caindo levemente. Sinto formigas me despedaçando com suas pequenas pinças, carregando meus fragmentos para sua despensa subterrânea. Sinto que sou mastigado e digerido pela rainha. Sinto-me forte e vigorosa. Sinto muitas vidas nascerem de mim. Sinto que eu e minhas pequenas irmãs-larvas somos carregadas para o "berçário". Aqui eu cresço, me torno operária. Daqui eu saio em busca de alimento, e aqui fora eu vejo uma folha seca caída no chão. Vejo o imponente tronco de uma velha árvore, e suas verdes e lustrosas folhas dançando em seus firmes galhos embalados pelo vento. Torço para que uma delas caia, e eu possa retribuir àquela que me deu trouxe à vida este grande favor, a que somos gratas por toda a nossa lamboriosa existência.

Vida de formiga, de larva, de rainha, de folha, de árvore, de semente. Vida que morre, dilacerada pelo bico de um pássaro faminto. Eu vôo. No caminho uma folha bate em minha asa, mas mal noto. Sigo em frente, vivendo, voando, comendo, perpetuando-me.

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Comentários:

Gostei muito disso: "Vida que morre,". Gostei de como você passou a idéia de que somos um organismo vivo, interligados, uma coisa só.

Luciana | 21-11-2007 21:43:39

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

[CONTO] A (R)Evolução Humana

(Texto originalmente escrito em 14/07/2007)



Sabe, às vezes eu olho lá pra cima e me pergunto: como eles ainda suportam morar ao ar livre? Tudo bem que por lá é tudo mais leve, mas também é tudo muito exposto, muito direto e objetivo. Falta todo esse mistério e densidade daqui, todo esse descobrir constante, essa nossa curiosidade quase infantil. Todo esse nosso envolvimento mais íntimo com o meio, essa liberdade no mover-se. Temos todas as direções a nosso alcance!

A verdade é que já estava mais do que na hora de evoluirmos, de mostrarmos toda a nossa capacidade de adaptação às adversidades. Há muito tempo precisávamos encarar as conseqüências de nossos descuidos seculares, usarmos toda a inteligência e conhecimentos acumulados, e encontrar uma solução para o problema que nós mesmos agravamos.

Mas foi somente quando os desastres começaram a atingir os "maiores do mundo", abalando todo o poder e estrutura de seus impérios, destronando "reis", e derrubando "ditadores", desmoralizando "imperadores", é que finalmente houve a tão necessitada união global, e o início do grande plano de remodelamento da humanidade.

Não havia mais pra onde fugir! Na verdade jamais houve, mas isto só se tornou mais evidente quando o mundo mostrou que já não tinha mais tanto espaço e recursos disponíveis pra tanta gente.

Não muito depois começaram a surgir os "loucos" com suas soluções "insanas". Talvez seriam queimados na fogueira alguns séculos antes, caso ousassem dizer tudo aquilo. Pra sorte deles foram simplesmente ignorados, alguns ridicularizados, e outros acabaram enlouquecendo de fato.

Mas no final, quando espaço e recursos enfim acabaram, foram justamente às idéias de alguns daqueles loucos que os "sãos" homens da ciência recorreram. Claro que, "pra variar", suas soluções foram postas em prática com os inevitáveis louvores tardios aos gênios do passado, e conseqüentes lamentos pela ignorância daqueles que não os entenderam.

O fato é que, naquela época, começou o que viria a ser um de nosso passos mais ousados e (r)evolucionários, mais do que quaisquer "grandes saltos" dados em superfícies desérticas de baixa gravidade. Nosso futuro estava aqui mesmo, só precisávamos dar mais atenção ao que possuíamos desde o início.

Então, começaram as intensas e exaustivas pesquisas e experimentos genéticos, sendo paralelamente seguidos pelo empenho de arquitetos e projetistas, sociólogos e filósofos. Gente que fabricava armas e naves espaciais se voltaram para esse "plano mundial de construção das bases de uma nova humanidade".

Logo surgiram os primeiros frutos, claro que deixando atrás de si um rastro de muitos fracassos, mas nada inesperados, pois todo sucesso que se preze é sustentado por inúmeras derrotas, que fortalecem o empenho dos que lutam para alcançá-lo. Frutos estes que começavam a apontar para o drástico desvio daquilo que seria como o caminhão desgovernado prestes a destroçar o fusquinha chamado "espécie humana". Sim, estávamos começando a girar o volante, e direcionar nossa história para uma nova fase, ou melhor, uma nova era, pra usarmos um termo mais apropriado. Assim, começamos a nos distanciar do futuro sombrio que muitos profetas e cientistas anunciavam como inevitável.

Sim, a incansável vontade humana persistiu, e a nova era chegou quando o primeiro de nós abriu suas mãos pequeninas de recém-nascido, e exibiu entre os dedos as membranas que tanto nos são úteis hoje. Claro que esta foi a primeira de uma série de modificações futuras. Depois vieram os dedos dos pés mais longos, também com membranas entre eles; corpos mais esguios isentos de pêlos; músculos, órgãos e ossos mais resistentes a zonas de altíssima pressão atmosférica...

E quando um de nossos antepassados respirou aqui embaixo, usando as primeiras brânquias humanas cem por cento eficientes, indicando o sucesso total do primeiro passo para a futura grande imigração, começaram os debates, discussões, revoltas e resistências contra as novas mudanças que estávamos prestes a nos impor.

Não gosto de pensar em quantos morreram naquelas inúteis guerras movidas por suas ultrapassadas éticas, e sim de comemorar a vitória da razão, que permitiu o início da vacinação mundial, que "curou" parte da humanidade de seu fim, e iniciou a propagação de nossa raça. Logo depois começou a grande imigração, que povoou as cidades subaquáticas construídas ao longo de décadas, resultado do esforço conjunto daqueles que, antes, perdiam seu precioso tempo procurando novas formas de mandar gente pro espaço, ou novas maneiras de matar alguém com "menos crueldade". Talvez um dos maiores exemplos de como a cooperação de pessoas de áreas distintas da ciência podem fazer uma diferença tremenda quando cada uma delas põe de lados suas divergências, e se concentram em um objetivo comum e maior, real e literalmente construtivo.

As primeiras cidades aos poucos se tornaram metrópolis, e não demorou muito para que várias delas se unissem, formando as primeiras nações submarinas da humanidade. Com isto ganhamos o maior de todos os espaços livres. Ganhamos a capacidade de "voar" em todas as direções. Ganhamos paisagens fantásticas formadas por faunas multicores de peixes, colônias de corais, estrelas do mar e crustáceos, e os jardins de algas. Ganhamos o espetáculo luminoso dos habitantes abissais, e um "céu" ondulante de luz solar aquaticamente filtrada. Ganhamos a maternal e uterina hidrosfera, que tão bem nos acolheu, como filhos há muito tempo afastados. Com isto recuperamos nossas origens mais ancestrais, retomando nossa profunda conexão com o primeiro ser vivente a surgir na primordial e borbulhante sopa protéica. Ficamos novamente íntimos do elemento que mais abundantemente nos constitui.

Temos o maior dos mistérios que este mundo nos escondeu desde a aurora dos tempos, enfim plenamente acessível e passível de ser desvendado. Temos muito a descobrir aqui, sobre as profundezas deste novo mundo, e de nossa própria alma.

Aos poucos conquistamos a simpatia de seus habitantes mais antigos, respeitando-os em seu espaço. Ganhamos deles a cooperação, o aprendizado.

Nossa dieta alimentar obviamente mudou, assim como o uso que fazemos de nosso instinto de sobrevivência. Mas isto nos ajudou a entrar em maior harmonia e equilíbrio com este novo mundo.

Muitos ainda vivem lá em cima, na superfície. Aqueles que optaram por preservar o que alguns deles definem como a "autêntica humanidade". Não acho que o fato de respirarem ar "puro" seja fundamental para definir um ser vivo como "humano", mas sei que, independente do que pensam a este respeito, estão se esforçando pra tornar o mundo terrestre tão habitável como o aquático. Pacientemente estão procurando curar o planeta do que seus excessos lhe causaram. Ouvi dizer, inclusive, que descobriram uma nova humanidade, formada por aqueles que vivem sob a terra. Quem sabe o que estes vizinhos recém-descobertos poderão lhes ensinar a respeito deste mundo tão vasto, surpreendente e misterioso?

Às vezes me pergunto pra onde as correntes do destino irão nos levar. Humanidades do fogo, talvez? Humanidades do ar? Das estrelas? Eu não sei, mas estou louco pra descobrir.

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Comentários:

Fui completamente transportada agora pro "Waterworld" (ou, se preferir, "O Segredo das Águas"). Me lembro que na sexta série fiz um trabalho de ciências sobre o futuro da espécie humana, e me inspirei nesse filme. Também morro de curiosidade de saber como será.

Luciana | 21-11-2007 21:59:12
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Talvez... talvez...

Aélsio | Email | 11-11-2007 20:27:21
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Pra começar, o novo visual ficou legal. Não entendi muito a do começo do texto ali (hoje eu to com uma preguiça..até pra pensar :/), mas eu gostaria de ter visto reis perdendo seus tronos :] Enfim, vc está louco pra ver no que tudo vai dar. Vou esperar até lá e ler mais alguns dos seus textos.

Heluza | 10-11-2007 14:47:29

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

[CONTO] O Coração e o Ser

(Texto originalmente concebido em 16/08/2006 e reescrito em 09/07/2007)



Havia quatro elementos: o vazio, o ser, o coração e seu globo.

O sistema era simples: o vazio envolvia o ser, que observava o coração dentro de seu globo.

O vazio era um espaço infinitamente preenchido por uma brancura cegante.

O ser também era branco, porém mais pálido que o do vazio, no qual seu corpo esguio flutuava. Estava nu, não se movia, e mantinha os olhos cinzentos fixos no coração pulsante.

O globo, de sutil matéria translúcida, continha o coração, e refletia em sua superfície o ser e o vazio. Dez vezes maior que o ser, seu pulsar emitia ondas de calor envolvente, aconchegante, maternal.

Não há como definir por quanto tempo o sistema se manteve assim. O que é passível de ser narrado resume-se à seguinte história:

Um dia, o ser mudou involuntariamente o foco da visão de seus cinzentos olhos, e a imagem do coração pulsante embaçou-se diante dele, trazendo ao primeiro plano uma outra que lhe fez sentir-se, pela segunda vez, surpreso: seu reflexo.

A surpresa cedeu prontamente espaço à curiosidade, e o ser começou, pacientemente, a descobrir-se em seu reflexo projetado no globo do coração. Primeiro percorreu com seus olhos a imagem de seu corpo. Viu-se esguio, magro, encurvado, braços pendentes, carregando mãos de cinco dedos. Viu duas pernas que saiam de sua cintura sustentando pés, também de cinco dedos. Também viu sua indefinição, sua falta de sexo, de identidade. Viu a pureza de sua brancura, e notou o vazio de sua consciência sem conceitos, que não era capaz de interpretar, categorizar e definir o que via como um ser composto de "braços" e "pernas" e "mãos" e "olhos". Notou que não sabia como reagir diante da visão de sua face lisa, oval, trazendo apenas um par de olhos cinzentos, e nada mais.

O ser, depois de um tempo, arriscou um primeiro movimento. Ergueu seu braço direito lentamente, levando sua mão até a altura de seus olhos. Fitou-a longa e atentamente. Em seguida ousou um segundo movimento, conduzindo-a à superfície de sua face. Deslizou-a sobre ela em um terceiro movimento, e sentiu-a lisa, macia, fria, mas ainda não sabia nomear tais sensações.

Com um quarto movimento repousou seu braço, enquanto acompanhava no reflexo todo o seu lento trajeto até a posição original. Neste momento notou que sua imagem sobrepunha-se ao vermelho do coração, desfocado ao fundo. Viu-se, subitamente, tingido pela cor dele e, num impulso, executou seu quinto movimento, mais uma vez erguendo a mão direita. Quando descobriu que ela permanecia palidamente branca, um profundo sentimento de perda e incompletude acendeu-se em seu interior.

Enquanto tentava concentrar-se neste sentimento, procurando uma forma de entendê-lo, o coração, que pulsava incessantemente, fez-se notar emitindo mais uma onda de calor maternal, a qual envolveu tão ternamente o ser, a ponto de fazê-lo esquecer-se do sentimento que nascera em si, e voltar o foco de sua visão para a fonte daquele calor vital.

Mas a imagem do imenso coração pulsante, que agora lhe parecia de um vermelho ainda mais intenso, logo fortaleceu o sentimento que havia esquecido há pouco, dando a ele condições de expandir-se dentro de sua mente pura e primordial, exigindo ao ser uma urgência na reparação da inquietude que gerava.

O ser voltou a focar seus olhos no reflexo de si, e notou como estava quase disperso no espaço de brancura infinita ao seu redor. Notou que seus contornos por muito pouco não sumiam diante de todo aquele vazio branco, que parecia ser capaz de absorvê-lo para si a qualquer instante.

A visão deixou-o ansioso, desesperado, inquieto. Sentiu-se sufocado ao notar-se envolto por um meio que lhe pareceu tão hostil e intimidador, tão intensamente branco em contraste com sua brancura pálida, que mal era suficiente para definir seus contornos, e salvá-lo da impessoalidade plena. Recorrendo ao único recurso sobre o qual conseguiu pensar, ergueu sua mão direita uma terceira vez, olhou-a o mais fixamente possível, e fechou-a com muita força, agarrando o imponderável, o intangível, na esperança de agarrar a si mesmo na tentativa de salvar-se do seu completo engolfamento pela brancura sem fim.

Quando se deu conta de que o esforço não fora forte o bastante, em um desespero instintivo encolheu-se sobre si mesmo, assumindo posição fetal, e assim ficou, até sentir-se novamente seguro, após receber as lufadas de materno calor emitidas pelo coração pulsante.

Finalmente sentindo-se seguro mais uma vez, o ser desdobrou-se, reassumindo a posição original. Voltou a fitar devotamente o coração e, imóvel, assim permaneceu por um longo tempo...

Súbito, num impulso de origem incerta, o ser lançou-se na direção do coração, estendendo-lhe a mão direita. A mão tocou o globo translúcido. O globo ondulou e partiu-se. O coração se libertou, expandiu-se, acolheu o ser em seu interior, e continou sua expansão pulsante.

O coração dobrou de tamanho, quadruplicou, octuplicou, e prosseguiu expandindo-se exponencialmente. Parecia inquieto, pulsava com certa ansiedade, na tentativa de cobrir o maior espaço possível com sua presença, que não parava de crescer. E assim continuou, indefinidamente, procurando preencher todo aquele infindável vazio branco em que estava, mas sem sucesso, pois ele, o vazio, era incansável em toda a sua infinitude.

O coração podia ficar do tamanho de um universo inteiro, e de fato ficou, podia cobrir a extensão de milhares, milhões de universos, e assim o fez, porém jamais conseguiria vencer a infinita presença daquela solidão de eterna brancura.

Após ficar expandindo em pulsações frenéticas por uma quantidade de tempo imensurável, o coração se deu conta de que jamais seria capaz de assumir toda a grandeza necessária para ocupar aquele vazio sem fim. Tal constatação tardia o assolou de forma tal que sua vontade de expandir em pouco tempo esgotou-se. Seu quente e vivo vermelho gradativamente empalideceu-se. Seu calor maternal foi se perdendo, tornando-o a cada dia mais frio. Sua presença foi minguando em velocidade bilhões de vezes maior que a usada enquanto expandia.

O coração encolheu, até ficar do tamanho de um punho fechado. Aos poucos seu vermelho pálido se tornou um rosado quase sem vida, que logo desbotou-se ainda mais. Por fim ficou branco, e foi murchando, murchando, até o tamanho de um feijão, e neste estado permaneceu por um longo tempo...

Um dia, aquele imóvel ponto errante vibrou timidamente, e um minúsculo calombo surgiu em sua superfície oval. Vibrou novamente e mais uma protuberância surgiu. E as vibrações se repetiram uma, duas, três vezes, totalizando cinco pequenos calombinhos. Um deles esticou-se um pouco para fora e comprimiu-se em sua base. Outros dois seguiram a deixa e também esticaram-se, porém mais do que o primeiro, ficando compridos e pendentes pouco abaixo dele. O quarto e quinto calombos acompanharam seus irmãos de cima e fizeram o mesmo. Logo aquela diminuta massa branca deu-se conta de onde poderia chegar, e com um enorme esforço contraiu-se todo, o que a fez brilhar. E o brilho foi se tornando mais intenso, e sua forma maior, e maior, e maior, e mais definida.

Do primeiro calombo brotaram olhos de um vermelho vivo. Do segundo e terceiro nasceram mãos de cinco dedos. Do quarto e quinto, pés.

O ser fitou longamente cada parte de seu corpo. Olhava cada uma das mãos e testava-as, movendo seus novos dedos. Tocava com elas seu rosto liso sem expressão, seu pescoço, seus ombros, seu... O peito! O que era aquilo em seu interior? Uma luz avermelhada pulsava lá dentro, vazando sua aura pulsante através da translucidez de seu tórax.

O ser tocou seu peito, e nele sentiu com maior intensidade o calor que o percorria por inteiro. Admirou devotamente o sólido fogo que trazia em si. Amava-o com um amor incondicional, primitivo, puro, ancestral. Amava-o tanto que logo sentiu-se incapaz de conter em si todo aquele amor, e por isso o libertou, atravessando com as mãos o peito de sutil matéria semi-intangível. Com elas segurou terna e cuidadosamente seu coração, e retirou-o de si, já envolvido pelo globo translúcido que fizera com parte de seu peito, a fim de manter seu amor protegido. Entregou-o ao vácuo onde flutuava.

Em pouco tempo o coração, alimentado pelo amor que o ser lhe transmitia incessantemente, cresceu, ficando cinco, dez vezes maior que ele. E assim estava no dia em que o ser fitou pela primeira vez seu reflexo no globo translúcido...

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Comentários:

Raro coração, raro. ;)

Aline | Email | 11-11-2007 22:17:53
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como o diz o meu irmão, o melhor dos três ultimos textos (ele comentou isso qd me perguntou se já tinha lido e tal). tão bonito e como tudo o que tu escreve tão cheio de emoção @@ faz com que a gente queira estar dentro deles. ;**

heluza. | 04-11-2007 01:22:45
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ao ler minha mensagem, tudo que tu precisas fazer agora é me imaginar batendo palmas... palmas... e mais palmas...

Aélsio Viégas | Email | 02-11-2007 16:06:51
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lindo! lindo! lindo! :)

Isabelle | Email | 02-11-2007 14:31:47