segunda-feira, 7 de novembro de 2005

[CONTO] A Bolha d'Água

Não é importante saber como ela se formou, e sim que tal ser glombuloso surgiu, em um momento qualquer, sobre aquela floresta que ele fazia questão de refletir e distorcer reflexivamente em toda a sua glombulosidade.

Um ser líquido, fluido e irriquieto, que parecia querer se espalhar pra todos os cantos, mas que paradoxalmente fazia um esforço hercúleo para se manter coeso, embora fluidoso, flutuando lá no alto, desafiando a lei descoberta por aquele físico que todos conhecem, o qual acabou com qualquer esperança de um ser desprovido de asas e ossos ocos levantar vôo quando bem entendesse.

Fluindo em sua limitação existencial, ele não observava o que havia ao seu redor, acima, lá no céu, coberto de nuvens, e abaixo, na floresta de árvores com folhas de fogo, por entre as quais corriam divertidamente galhofósseis-protoplasdônticos, criaturas curiosas e interessantes, cuja descrição eu reservo para outra oportunidade, tendo em vista que ela não se mostra muito importante no momento, já que estamos falando do ser glombuloso que é o protagonista de nossa história.

Como dizíamos, tal construto líquido autocontido flutuava sobre a floresta de árvores-fogo, e apesar de possuir certos indícios de consciência, não tinha capacidade de enxergar nada, apenas de refletir aquilo que o cercava, sem a possibilidade de reter a imagem para si, mas apenas exibir tais reflexos distorcidos do ambiente para um possível observador externo.

Tão curiosa como a forma que tais seres glombulosos surgem sobre florestas de árvores-fogo é a maneira como desaparecem, ou, mais curiosa ainda, o que leva tais seres a decidirem, involuntariamente, desaparecer.

Em um dado momento de suas existências anti-gravitacionais fluidosas as bolhas d'água simplesmente se cansam de refletir o ambiente, e acham que seria mais interessante refletir sobre suas próprias existências, porém, antes mesmo de porem tal reflexão em prática, sua coesão molecular se desfaz, e eles explodem no ar, tendo suas gotículas evaporadas pelas folhas de fogo das árvores da floresta abaixo.

Uma pena não ser possível que uma bolha d'água previna outra para que não caia no mesmo erro, caso contrário, existiriam mais destes seres curiosos flutuando glombulosamente sobre as florestas de árvores-fogo, ao invés de ocuparem a lista dos seres reflexivos em extinção, logo abaixo de um certo símio que pensa ter ficado inteligente demais pra viver em árvores, e admitir que ocupa um lugar na tal lista.

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