quinta-feira, 26 de janeiro de 2006

[REFLEXÕES] Valorizações tardias de perdas iminentes


Taí um tema recorrente na vida de qualquer pessoa: as perdas. Fatalmente elas vêm, virão ou já vieram. Somos todos cheios de perdas nos arquivos de nossas existências, e se alguns de nós não têm uma grande coleção delas, digo a eles que fiquem tranqüilos, pois uma hora ela irá aumentar.

Mas, o aspecto mais curioso da perda, e tão recorrente quanto ela própria, é o valor tardio que atribuímos ao objeto perdido ou que estamos prestes a perder.

É quando manifesta-se aquele velho clichê que raramente evitamos de cometer: dar o valor devido a algo ou alguém apenas quando sua perda se torna iminente.

Por mais que o tema deste texto, e ele próprio, seja um dos maiores habitantes da cidade chamada "Lugar Comum", é impressionante, pra não falar preocupante, em uma análise mais profunda do assunto, como ele jamais deixa de ser atual. Raras são as pessoas neste mundo que conseguem fugir deste que é um dos erros mais cíclicos do ser humano.

E como minha intensão aqui é ser transparente e sincero não só com meus (poucos) leitores, mas comigo mesmo, posso me reservar à liberdade de expôr-me como exemplo do que escrevi. Não preciso ir muito longe pra justificar-me como tal, basta que eu fale de minha situação atual: ter que lidar com uma nova mudança de cidade. Esta, por si mesma, é uma causa clássica das chamadas "valorizações tardias de perdas iminentes".

Muda-se de cidade e, de carona, vem uma série de obstáculos para se transpor, readaptações a serem feitas, planos a reconfigurar, e especialmente extrair de tudo isto algo bom e proveitoso pra nossas vidas. É nessas horas, em meio a uma tonelada de preocupações, que finalmente sentimos a necessidade de pausartudo ao nosso redor, nossa vida em si, naquele exato ponto do tempo e do espaço, e procurar observar cada milímetro daquele plano geral congelado bem na nossa frente.

Vemos tudo aquilo que realizamos ali, tudo por que passamos naquele lugar, e nos lembramos das pessoas que estiveram ao nosso lado em cada momento único e especial. Recordamo-nos das oportunidades que tivemos e agarramos, daquelas que passaram por nós e só ficamos olhando sua partida. Do que ganhamos e do que perdemos, assim como de quem ganhamos e de quem perdemos.

E depois daquela rápida apreciada do momento que suspendemos diante de nossos olhos, pensamos, finalmente, e pela primeira vez, no que iremos perder. Em cada elemento presente no quadro à nossa frente do qual teremos que nos afastar, e na incerteza que ronda a possibilidade de reencontrarmos alguns deles.

Diante de tantos detalhes a serem resolvidos, ironicamente encontramos um espaço em meio ao caos, um lugar tranqüilo em meio à ruidosidade cotidiana para pensar naquilo cuja presença deveria ser constante em nossa mente, em cada um de nossos dias: a certeza de que o mundo e as pessoas evoluem com as mudanças, e que as perdas são parte do processo, o qual seria menos doloroso se a cada um fosse dado o devido valor, não na iminência de sua ausência, mas na constância de sua presença.

Valorizemos mais o hoje, esqueçamos um pouco do amanhã. Vamos seguir o conselho do cantor e poeta que já se foi, e cuja presença permanece em uma frase (não precisamos ir mais longe que isto), que deveria ser grafada em caracteres eternos, pois o amanhã pode não vir pra nós, mas para outros ele fatalmente virá. Que estes, ao menos, sigam o conselho que ainda não aprendemos a seguir.

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Comentários:

Tem coisas que realmente nunca muda... vc realmente dá pra Paulo Coelho

Cilon | 27-01-2006 22:31:03
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outro habitante do "Lugar Comum" é "o Mundo dá Voltas"... e que história é essa de "programa de tv favorito: nenhum"???

mariana | Email | 26-01-2006 16:25:53

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