segunda-feira, 2 de maio de 2011

[CRÍTICAS] Filmes do Final de Semana

A partir de hoje postarei no blog pequenas críticas de filmes que assisti no final de semana. Pra começar temos: Barton Fink - Delírios de Hollywood, Time - O Amor Contra a Passagem do Tempo, Rashomon e Minha Amada Imortal.

A idéia é postar semanalmente quatro críticas de uma só vez, mas estou aceitando sugestões para o formato.


Barton Fink - Delírios de Hollywood (Barton Fink, EUA)

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Direção: Joel Coen
Roteiro: Joel Coen e Ethan Coen
Elenco: John Turturro (Barton Fink), John Goodman (Charlie Meadows), July Davis (Audrey Taylor), Michael Lerner (Jack Lipnick), John Mahoney (W. P. Mayhew), Tony Shalholb (Ben Geisler), Steve Buscemi (Chet)
Ano de lançamento: 1991
Duração: 116 min.

Sinopse: Nova York, 1941. Barton Fink (John Turturro) é o dramaturgo do momento e toda a Broadway, além da imprensa, se curva ao seu talento. Como conseqüência Fink vai para Hollywood para escrever um roteiro para um filme B, que aborda a luta livre. Ele se hospeda em Los Angeles no Earle, um hotel de segunda categoria, mas o objetivo de Fink é ficar longe de tudo e todos e se concentrar no seu roteiro. Porém, ele é atingido por um bloqueio de escritor de tal natureza que não consegue escrever nada. Charlie Meadows (John Goodman), seu vizinho, um amigável vendedor de seguros, tenta ajudá-lo, mas diversos acontecimentos bizarros, aliados a um calor infernal, surgem na vida de Barton.

Crítica:
Desde a fotografia primorosa de Roger Deakins, passando pelo visual opressor do hotel onde Fink se hospeda, e o uso inteligente de espaços vazios, e corredores vertiginosos, que ilustram a solidão e desorientação do protagonista num mundo ao qual não está habituado, a direção de Joel Coen funciona magnificamente a favor da história.

Barton Fink é quase um "irmão mais velho" de Adaptação, de Spike Jonze, outro filme excelente sobre um escritor com crise criativa. Neste a abordagem do tema é mais sóbria que naquele roteirizado por Charlie Kaufman, embora tenha sua parcela de delírios, como o subtítulo brasileiro deixa bem claro.

As atuações são muito equilibradas, com destaque para Michael Lerner, como o hilário e verborrágico Jack Lipnick; John Mahoney, que diverte muito em suas poucas partipações como o excêntrico W. P. Mayhew; e John Goodman, que sem muito esforço conquista a simpatia de Barton e do espectador interpretando Charlie Meadows.

John Turturro faz um de seus melhores papéis aqui, oscilando com segurança entre as pequenas neuras do personagem e os picos de histerismo, e torna palpável toda a angústia por ele sofrida.

A direção de arte também merece elogios pelo trabalho de recriação de época, e pelo quarto de Fink, que ao longo da história passa a refletir sutilmente o estado interior do personagem, desde os papéis de parede se despregando, até o quadro da moça diante do oceano que ele usa a todo momento buscando recuperar a paz que tanto almeja alcançar consigo mesmo. O design de som também é ótimo, reproduzindo com grande eficácia a tão conhecida sensação de desconforto que sentimos quando um pernilongo vem atrapalhar nosso sono, e os pequenos ruídos que ouvimos à noite quando o "silêncio" impera.

Mais um trabalho de direção exemplar de Joel Coen, que ao lado do irmão prova mais uma vez seu talento em equilibrar comédia e drama, e ainda se permite acrescentar uma dose de suspense que perdura até o último take, que é tanto poético quanto enigmático.

Nota: 4,5 de 5


Time - O Amor Contra a Passagem do Tempo (Shi gan, Japão e Coréia do Sul)


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Direção: Ki-duk Kim
Roteiro: Ki-duk Kim
Elenco: Jung-woo Ha (Ji-woo), Hyeon-a Seong (See-hee), Park Ji-Yeon (Seh hee - antes da cirurgia), Sung-min Kim (cirurgião plástico)
Ano de lançamento: 2006
Duração: 97 min.

Sinopse: Seh-Hee (Park Ji-Yeon) e Ji-Woo (Jung-Woo Ha) são namorados de longa data. Eles estão apaixonados, mas Seh-Hee tem uma crise de ciúmes quando seu namorado se sente atraído por outra mulher. Ela está convencida de que Ji-Woo perderá o interesse no relacionamento à medida que o tempo for passando. Para prevenir o rompimento, Seh-Hee decide passar secretamente por uma cirurgia plástica, de modo que ela se torne uma "nova mulher" para o namorado. Certo dia ela desaparece do mapa, deixando Ji-Woo magoado. Com o tempo, porém, ele vai se esquecendo de Seh-Hee, e termina por se apaixonar por uma mulher misteriosa, que guarda um segredo que mudará suas vidas.

Crítica:

Sempre admirei a qualidade plástica dos filmes de Ki-duk Kim, e sua capacidade de dizer muito com poucas palavras, como em Casa Vazia, ou no visualmente arrebatador Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera. Porém neste filme achei que pesou-lhe um pouco a mão.

A premissa é criativa, e toca sem rodeios num tema contemporâneo e relevante. Além disto Ki-duk faz bom uso de metáforas visuais que ilustram os anseios dos personagens, sendo a mais evidente delas a praia de esculturas, em sua falsa ilusão de imutabilidade diante da passagem do tempo. Tinha tudo para ser um ótimo thriller psicológico, mas...

A recorrência com que alguns cenários são revisitados no decorrer da história acaba tornando-a redundante a partir de um certo ponto. A impressão que o diretor passa é de que ele queria deixar bem claro o significado de determinados cenários para aqueles personagens, como fica evidente nas inúmeras vezes em que aparece a escultura que ilustra o cartaz do filme.

Além disto as interpretações soam exageradas em diversos momentos, o que acaba comprometendo o efeito dramático de algumas cenas.

Reconheço o talento do diretor, e entendo as intenções que o levaram a dirigir este filme, e o que fez com que tomasse certas escolhas, mas a execução me pareceu um tanto desarticulada. Os personagens são frágeis, pouco desenvolvidos, e não cativam. Assim fica difícil se importar com seus dilemas.

Ainda assim, a história funciona como uma boa crítica à superficialidade de grande parte das relações humanas.

Nota: 3 de 5



Rashomon (Rashômon, Japão)

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Direção: Akira Kurosawa
Roteiro: Akira Kurosawa, Kazuo Miyagawa, Ryonosuke Akutagawa, Shinobu Hashimoto
Elenco: Minoru Chiaki (Sacerdote), Takashi Shimura (Lenhador), Kichijiro Ueda (Plebeu), Machiko Kyô (Masako Kanasawa), Toshirô Mifune (Tajômaru), Masayuki Mori (Takehiro Kanasawa), Fumiko Honma (Médium), Daisuke Katô (Policial)
Ano de lançamento: 1950
Duração: 88 min.

Sinopse: O filme descreve um estupro e assassinato através dos relatos amplamente divergentes de quatro testemunhas. A história se desvela em flashbacks conforme quatro personagens recontam os eventos de uma tarde em um bosque, através de um flashback dentro de outro, pois os relatos das testemunhas são recontados por um lenhador (Takashi Shimura) e um sacerdote (Minoru Chiaki) para um grosseiro plebeu (Kichijiro Ueda), enquanto eles esperam por uma tempestade em um portal arruinado. Cada história é mutuamente contraditória, deixando o espectador incapaz de determinar a verdade sobre os eventos.

Crítica:
Considerado a obra-prima de Akira Kurosawa, dono de um dos roteiros mais inovadores do cinema, Rashomon é um dos filmes de maior influência da história da 7ª arte, tendo servido de fonte de inspiração tanto para inúmeras produções cinematográficas, como também para séries de TV e até desenhos animados. Com tantos atributos, falar desta obra de Kurosawa se torna uma tarefa que intimida qualquer cinéfilo que se dedica a escrever sobre sua paixão e tem o mínimo de respeito por ela.

A trama é envolvente do início ao fim, explorando múltiplos pontos de vista, e a verdade por trás do assassinado de um samurai. Nela importa mais desvendar os motivos que levaram cada personagem a contar versões contraditórias de um mesmo fato, do que a verdade em si. É interessante notar que cada narrador opta por uma abordagem que, de uma maneira ou de outra, preserve sua honra, uma das virtudes mais valorizadas pelos japoneses.

Já a direção de Kurosawa exibe um virtuosismo que em nenhum momento é usado gratuitamente. Seus travellings surgem na medida certa, embrenhando-se na floresta em que se passa boa parte da trama, sem que a câmera que acompanha toda a ação do elenco se perca em tomadas confusas. Seus ângulos e enquadramentos são determinados com precisão, compondo um mise en scène harmônico. Além disso, durante as cenas dos depoimentos, Kurosawa opta por jamais mostrar os interrogadores, cujas vozes sequer são ouvidas, evidenciando seu desejo de reservar tal papel a nós, espectadores, que acompanhamos as narrativas conflituosas.

É notória ainda a estrutura engenhosa do roteiro, que se desenrola em três níveis distintos: o primeiro sendo aquele em que o padre, o lenhador e o plebeu conversam debaixo do portal Rashomon; enquanto no segundo temos as seqüências que correspondem às narrativas do lenhador e do padre referentes aos interrogatórios; e no terceiro temos as múltiplas versões do crime da floresta. A maneira com que os três são apresentados e se alternam é elegante o bastante para tornar a trama mais intrigante do que confusa (embora haja uma parcela intencional de confusão).

Confesso que as atuações me incomodaram um pouco por seu overacting, mas, levando em conta que a maioria delas estão inseridas nas narrativas apresentadas pelo lenhador e o padre ao plebeu, não se pode descartar a idéia de que as mesmas refletem a impressão dos narradores sobre aqueles personagens, e não os personagens tais como são na realidade.

Seja como for, 61 anos depois, Rashomon permanece como uma obra que merece todo prestígio e respeito que conquistou. Magnum opus de um dos diretores cuja obra todo amante de cinema deve conhecer.

Nota: 5 de 5


Minha Amada Imortal (Immortal Beloved, Reino Unido e EUA)

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Direção: Bernard Rose
Roteiro:
Bernard Rose
Elenco: Gary Oldman (Ludwig van Beethoven), Jeroen Krabbé (Anton Feliz Schindler), Isabella Rossellini (Anna Marie Erdödy), Johanna ter Steege (Johanna Reiss), Marco Hofschneider (Karl van Beethoven), Valeria Golino (Giulietta Guicciardi)
Ano de lançamento: 1994
Duração: 121 min.

Sinopse: Viena, 1827. Ludwig Von Beethoven (Gary Oldman) morre e um grande amigo do compositor, Anton Felix Schindler (Jeroen Krabbé), decide cumprir o último desejo do maestro, que deixava em testamento tudo para a "Amada Imortal", sem especificar o nome desta mulher.

Assim empreende uma jornada tentando localizá-la, encontrando em sua procura um retrato desconhecido de Beethoven.


Crítica:
Possuindo uma estrutura narrativa que lembra a de Cidadão Kane, a trama de Minha Amada Imortal é sustentada pelos depoimentos de personagens que conviveram em algum momento com Ludwig van Beethoven (Gary Oldman), do auge à decadência de sua carreira e de sua saúde.

Além da primorosa direção de arte e figurinos, que recriam com excelência o período histórico em que se passa a trama, a ótima fotografia valoriza os cenários e paisagens, seja realçando a suntuosidade de ambientes requintados, ou refletindo nestes o estado interior do protagonista.

Outra aspecto técnico que se destaca é o design de som, que reproduz com precisão a surdez de Beethoven em diversos momentos da história, levando o espectador a dividir com o personagem desde o aflitivo momento em que sai pelas ruas à procura de Karl (Marco Hofschneider), até o belíssimo instante em que ele demora alguns segundos para se dar conta de que estava sendo aplaudido de pé por uma platéia extasiada.

Usando de maneira inteligente composições do próprio Beethoven em quase toda a trilha sonora, ressaltando a importância de passagens marcantes na vida do compositor, Bernard Rose utiliza com brilhantismo o 2º movimento da 7ª Sinfonia em A maior, op. 92, para pontuar os conflitos entre Beethoven e Johanna (Johanna ter Steege) pela guarda de Karl, cuja profundidade só passamos a entender no último ato do filme. E, claro, a belíssima execução de Ode à Alegria, da 9ª Sinfonia, no momento mais sublime o filme, o qual faz por merecer um parágrafo à parte.

Beethoven sobe ao palco para acompanhar de perto a execução daquele que é o auge de sua obra mais famosa, e a partir daí começa uma alternância entre cenas do teatro onde ele se encontra diante da orquestra, e outras de um episódio marcante de sua infância. Toda a seqüência é de uma beleza arrebatadora, e termina com Beethoven, ainda menino, flutuando sobre a superfície de um lago que reflete o céu noturno acima. A câmera vai se afastando da criança, que se perde no meio das estrelas. O simbolismo é simples e direto: naquele que é seu momento de maior realização, Beethoven rememora o primeiro passo que deu na infância, para longe da pobreza e do sofrimento que o cercavam, e alcança com sua obra um patamar mais elevado, que o faz sentir-se parte de algo maior que ele próprio.

O filme poderia perfeitamente acabar sem prejuízos na cena descrita no parágrafo acima. Eu mesmo a considero o final ideal, mas o diretor preferiu se estender um pouco mais, e amarrar as pontas soltas que espalhou no decorrer da história, as quais são bem resolvidas, e emocionam na medida certa, mas não conseguem se igualar à catarse proporcionada minutos antes.

Com um elenco de interpretações competentes e equilibradas, destaca-se, obviamente, Gary Oldman, que faz um trabalho brilhante, conseguindo retratar bem o efeito dos anos sobre o personagem, e a deterioração física e mental de Beethoven, apoiado pela boa maquiagem. Isabella Rossellini também faz um ótimo trabalho interpretando Anna Marie Erdödy.

Minha Amada Imortal é tanto uma excelente cinebiografia de Beethoven, como um estudo sensível de um personagem cuja obra eternizou-se na consciência coletiva da humanidade. Não há neste mundo quem não conheça uma composição que seja deste gênio que até hoje desperta enorme fascínio, elevando a alma de quem ouve suas composições a dimensões apenas vislumbradas pelo homem em seus sonhos mais sublimes.

Nota: 5 de 5

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