sábado, 21 de maio de 2011

[CRÍTICAS] Possuídos :: O Padrasto :: O Segredo do Lago

Possuídos (Bug, EUA e Alemanha)

Photobucket

Diretor: William Friedkin
Roteiro: Tracy Letts
Elenco: Ashley Judd (Agnes White), Michael Shannon (Peter Evans), Harry Connick Jr. (Jerry Goss), Lynn Collins (R.C.) , Brian F. O'Byrne (Dr. Sweet)
Ano de lançamento: 2006
Duração: 102 min.

Sinopse: Após escapar de Goss, seu ex-marido abusivo, recentemente solto da prisão, Agnes, uma solitária garçonete com um passado trágico, muda-se para um motel barato de beira de estrada. Um dia R.C., sua colega de trabalho lésbica, apresenta-lhe Peter, um sujeito peculiar e um tanto paranóico, com quem Agnes começa a ter um romance. Porém, as coisas não são como parecem, e Agnes está prestes a experimentar um pesadelo claustrofóbico quando insetos começam a surgir...

Crítica:

Possuídos é daquele tipo de suspense que sustenta-se mais pelas sensações que desperta, do que pelas grandes revelações que reserva ao espectador.

É interessante acompanhar a progressão da história, a começar pela forma gradativa com que é construída. Desde o plano aéreo inicial, em que a câmera se aproxima lentamente do motel em que Agnes vive, rodeado por um deserto que mais tarde mostra-se um reflexo do quadro emocional da personagem; até a longa seqüência de abertura, na qual é perturbada diversas vezes por telefonemas em que a pessoa do outro lado da linha não diz nada. William Friedkin, em poucos minutos, estabelece a atmosfera e apresenta o cenário onde grande parte da história se desenrolará.

Confesso que este é o primeiro filme que assisto com Ashley Judd, mas já fiquei impressionado com o seu talento. Sua interpretação é convincente e cheia de nuances. O desleixo de Agnes nas primeiras cenas gera certa antipatia, mas graças à competência da atriz, e ao ótimo roteiro, logo entendemos os motivos que a levaram a adotar aquela postura, e não demora para que nos simpatizemos com ela, e enxerguemos a beleza que se esconde por trás daquela amargura e baixa auto-estima que vemos no início (claro que ajuda o fato da atriz ser bonita, mesmo com as gordurinhas a mais que a personagem exigia, além de ter um sorriso lindo). Toda insegurança e carência afetiva de Agnes, que não hesita em satisfazê-la com pessoas que lhe dão um pouco mais de atenção, como sua amiga R.C. (Lynn Collins), são bem retratadas por Ashley Judd, assim como a instabilidade de seu humor, que ao primeiro sinal de que está sendo magoada não hesita em deixar sua raiva explodir na cara de quem a fez sofrer.

Mas Possuídos não seria um filme tão magnético sem a outra metade de sua força motriz: Michael Shannon. Seu personagem entra timidamente na história, mas aos poucos toma conta dela e a domina com a mesma eficácia com que estabelecesse um vínculo afetivo-paranóico-obsessivo com Agnes. Shannon é hipnótico em cena, com seus maneirismos, seu olhar perturbador e suas neuroses, tornando Peter imprevisível. É especialmente graças a ele que o filme é tão eficiente na construção de seu suspense.

Paranóia é o que comanda todo o longa e o define. O importante não é entender a origem do que acomete o casal, mas tornar seu público tão obcecado pela verdade quanto Agnes e Peter, a ponto de arrastá-lo pela mesma viagem alucinante a que são submetidos, regada a conspirações governamentais e insetos que só eles enxergam, e cuja presença só eles sentem.

William Fredkin pega o espectador pela mão e o leva até o final sem tropeços, tornando-o a cada passo mais envolvido pela situação kafkaniana de seus protagonistas, e o mantém prisioneiro do quarto de motel de onde Peter e Agnes poucas vezes saem. O desejo do diretor de tornar seu público íntimo de seus personagens evidencia-se especialmente na cena de sexo do casal, em que lampejos da nudez dos atores criam um erotismo minimalista muito eficiente nas sensações que desperta. E aqui cabe elogiar a excelente montagem, que dá ao longa um ritmo compassado e quase hipnótico, que aumenta o interesse do espectador pelo desenrolar dos fatos.

Preservando a natureza incômoda dos eventos, e a incerteza quanto à origem deles, o roteiro é hábil ao oferecer algumas possíveis explicações através da lógica distorcida de seus protagonistas, sem confirmá-las totalmente. Ao encerrar a narrativa sem abrir mão de contar a história apenas do ponto de vista do casal, William Friedkin respeita a lógica interna do longa, concluindo-o no exato momento em que Agnes e Peter chegam a uma resolução para seus conflitos. Para o casal, qualquer explicação que não partisse deles seria insatisfatória e não confiável, tamanho o estado de paranóia em que se encontram no ato final (o visual "alienígena" que o quarto do motel adquire é um indicativo de quão distanciados da realidade exterior eles estão). Uma conclusão corajosa para um suspense imprevisível.

Nota: 4 de 5


O Padrasto (The Stepfather, Reino Unido e EUA)

Photobucket

Diretor: Joseph Ruben
Roteiro: Carolyn Lefcourt, Brian Garfield e Donald E. Westlake
Elenco: Terry O'Quinn (Jerry Blake), Jill Schoelen (Stephanie), Shelley Heck (Susan), Charles Lanyer (Dr. Bondurant), Stephen Shellen (Jim Ogilvie)
Ano de lançamento: 1987
Duração: 89 min.

Sinopse: Um homem obcecado por valores familiares chamado Jerry Blake casa-se com mães viúvas e divorciadas. Sempre que sua nova família desvia-se dos padrões que ele julga os mais corretos, Jerry mata mãe e filhos, altera sua aparência, assume uma nova identidade, e muda-se para uma nova cidade, onde recomeça seu ritual. Agora é a vez de Susan, e sua filha adolescente Stephanie, mas a garota logo mostra que não será um alvo fácil.

Crítica:

Com uma boa premissa, e um personagem cuja verdadeira natureza é exposta logo na seqüência de abertura, O Padrasto começa promissor, mas infelizmente mostrasse irregular na execução.

Terry O'Quinn é bem sucedido na composição de Jerry Blake, que de início choca, para logo adiante despertar curiosidade ao surgir como um marido carinhoso e um padrasto atencioso. Seus monólogos no porão da casa são bem trabalhados, oferecendo pistas sobre a origem de sua psicopatia, sem entrar em detalhes.

A história ainda conta com outra personagem interessante, a adolescente Stephanie, vivida por Jill Schoelen, que foge dos padrões da época, brigando com socos e pontapés com uma colega de escola que a ofende (no lugar dos clássicos puxões de cabelo); tomando a iniciativa e flertando sem inibições com um garoto; e conduzindo sua própria investigação para descobrir o segredo de Jerry.

Mas, exceto por Charles Lanyer, que torna seu Dr. Bondurant um personagem simpático, o restante do elenco é regular. Susan (Shelley Heck) é insossa e insuportavelmente submissa, e Jim (Stephen Shellen) tem a subtrama mais inútil e tediosa do longa.

O roteiro ousa ao incluir insinuações de que o Dr. Bondurant tem interesses mais platônicos do que profissionais por Stephanie, além de duas cenas rápidas em que a garota aparece nua durante o banho (apesar de Jill Schoelen ter 24 anos na época, vale lembrar que sua personagem tem 16 anos no filme). Na mesma seqüência Joseph Ruben faz uma "meia-homenagem" ao clássico Psicose, levando o espectador a acreditar que verá uma nova reprodução da cena icônica do filme de Hitchcock, apenas para ir contra as expectativas criadas, um detalhe que particularmente me agradou por fugir do óbvio. Infelizmente o filme surpreende apenas nesta cena, pois em nenhum outro momento a história consegue manter o espectador incerto sobre o que virá a seguir.

Previsível e formulaico do início ao fim, O Padrasto vale mais pela curiosidade de assistir Terry O'Quinn, o John Locke da série Lost, interpretando um personagem bem diferente daquele que viveu em seu trabalho mais conhecido.

Nota: 3 de 5


O Silêncio do Lago (Vanishing, Holanda e França)

Photobucket

Diretor: George Sluizer
Roteiro: Tim Krabbé e George Sluizer
Elenco: Bernard-Pierre Donnadieu (Raymond Lemorne), Gene Bervoets (Rex Hofman), Johanna ter Steege (Saskia Wagter), Gwen Heckhaus (Lieneke)
Ano de lançamento: 1988
Duração: 107 min.

Sinopse: Rex e Saskia, um jovem casal apaixonado, sai de férias. Numa parada em um posto de gasolina Saskia desaparece. Rex passa os próximos três anos tentando encontrá-la, até o dia em que começa a receber cartões postais de alguém que promete revelar o que aconteceu com Saskia.

Crítica:

O que mais chama a atenção em O Silêncio do Lago é sua estrutura narrativa. A história vai e volta no tempo sem rodeios, algumas vezes surpreendendo o espectador ao revelar que determinada cena se passa antes da que acabamos de assistir. Aí reside grande parte da inventividade do longa.

Rex e Saskia surgem como um casal comum, que em questão de minutos se diverte num jogo de adivinhações enquanto viajam, para logo em seguida mergulhar num clima desconfortável quando a gasolina do carro acaba dentro de um túnel escuro, e o rapaz deixa a moça sozinha enquanto parte atrás de combustível. É uma cena importante pela maneira como tal fato afetará Rex mais adiante na história, e por introduzir um elemento simbólico que voltará em diversos momentos do filme: o sonho enigmático de Saskia. Mais sobre ele logo abaixo.

Após fazerem as pazes num posto de gasolina, é a vez de Saskia deixar Rex sozinho para comprar alguns suprimentos para o resto da viagem. Quando o rapaz acha que ela está demorando demais, é inevitável que pensemos que trata-se de uma vingança da garota pelo que seu namorado fez com ela mais cedo. Porém, quando Rex começa a reunir informações sobre os últimos passos de Saskia, os fatos apontam para algo mais aterrador. E esta é apenas a introdução da história.

A grande sacada do roteiro é levar o espectador a acreditar que a trama será totalmente focada nos esforços de Rex para encontrar Saskia, apenas para mudar seu foco para a história de Raymond Lemorne (Bernard-Pierre Donnadieu), o sujeito que a seqüestrou. A partir daí o filme reconstrói toda a cadeia de acontecimentos que o levaram a cometer o crime, e passa a revelar as motivações do personagem, que se torna o grande protagonista do longa.

Raymond guarda semelhanças com o personagem principal do romance Crime e Castigo, de Dostoiévski, encarando o crime como um meio de pôr em prova sua filosofia de vida, mas, ao contrário de Raskólnikov, não permite que a culpa o atormente a ponto de voltar seu plano contra si mesmo, além de ter uma vida social saudável, e uma família que o respeita por ser um pai e um marido exemplar. Bernard-Pierre Donnadieu trabalha com precisão ambos os lados de Raymond, cujo plano é exaustivamente ensaiado, e revelado em detalhes, enquanto procura manter as aparências ao lado da esposa e filhas. É graças ao ator que o filme funciona como um intrigante estudo de personagem, ao mesmo tempo que oferece um suspense envolvente.

Voltando ao sonho de Saskia, a dupla de ovos dourados flutuando num espaço negro ganha várias rimas visuais em diversos pontos da narrativa, como nas cenas noturnas protagonizadas por Rex, onde o brilho amarelado dos faróis de carros remetem diretamente ao túnel escuro onde Saskia se lembra do sonho no início do filme. Uma forma sutil encontrada pelo diretor para ilustrar a culpa que ainda atormenta Rex, além de servir como pistas sobre o destino da garota e a conclusão da história.

Por detalhes como o descrito acima, e a forma como o roteiro trabalha a interação de Rex com Raymond, sem apelar para lugares comuns, aumentando exponencialmente o interesse e a curiosidade do espectador pelo desenrolar dos fatos, O Segredo do Lago é uma aula sobre como fazer um suspense de qualidade sem histrionismo e reviravoltas absurdas.

Nota: 4,5 de 5

Nenhum comentário:

Postar um comentário