quinta-feira, 16 de outubro de 2003

[REFLEXÕES] O Convite (ou "Da ordem ao caos")

Vez ou outra nós recebemos um convite, quando nossas vidas se encontram presas em uma rotina. Seja ela intensa, e agradável, ou um perfeito marasmo insuportavelmente tedioso.

Um convite que nos oferece uma nova opção. Uma nova forma de "gastar a vida". Que, com sorte, para alguns, pode ser uma maneira de aproveitá-la enquanto a gasta.

Aproveitar a vida, vendo de uma ótima mais fria e lógica, nada mais é do que um modo de encobrir ou, melhor dizendo, disfarçar o ato de se gastá-la. Pois, mesmo aproveitando-a o máximo que nos é possível, isso não significa que, automaticamente, deixaremos de gastá-la durante os momentos mais
"vividos" dela. Se é que me vocês entendem.

Porém, o assunto em pauta não é como gastamos ou deixamos de gastar; aproveitamos ou deixamos de aproveitar a vida, e sim dos convites que, de tempos em tempos, recebemos para mudar nossas rotinas, e, conseqüentemente, a forma como iremos empregar cada minuto e segundo de nossas existências dentro de um espaço de tempo indeterminado. E aqui não podemos esquecer que a imprevisibilidade da vida sempre deve ser levada em consideração, pois nada é totalmente certo e seguro de se manter como está.

A vida não é algo estático, e muito menos estável. Muito pelo contrário, nada é mais intenso e caótico do que o período no qual existimos sobre a superfície da Terra.

Claro, não podemos desconsiderar a simplicidade do princípio. Tudo começa de uma forma bem simples. Um espermatozóide se fundindo a um óvulo, dando origem a uma reação em cadeia que faz com que a célula única, na qual juntos se transformaram, passe a se multiplicar, até atingir um número milhares, milhões... bilhões de vezes maior do que aquele que tínhamos inicialmente. E a partir daí, o que era uma simples célula ovo se torna a criatura mais complexa e fascinante, biológica e psicologicamente, a caminhar por esse mundo que, ao longe, no espaço, não passa de uma esfera azul, tão simples quanto a célula e nos originou.

O universo também foi simples em seu princípio. Na verdade, talvez foi a coisa mais simples que já existiu na história de toda a existência. Era um simples ponto, imperceptível e ofuscado por um imenso nada que o rodeava. Porém, algum dia, aquele ponto resolveu crescer, se espalhar, e preencher parte daquele nada ao seu redor. Uma explosão aconteceu, e a partir disso, a ordem cedeu seu lugar ao caos. Um caos que continua até então, tornando tudo mais complexo e impressionante. Mais grandioso e exuberante. E tudo isso partiu de um simples ponto.

E novamente fugimos do assunto principal desse post. Falava das chances que recebemos, de tempos em tempos, para mudarmos nossas vidas. Atualmente eu passo por um momento assim, como já passei inúmeras vezes, fato esse que é bastante comum, pois vivemos mudando nossos hábitos, nossas rotinas, nossa maneira de empregar o tempo que nos resta aqui neste mundo.

É interessante descrever como me sinto quando estou "inserido" nesse tipo de decisão. É quase como ser dotado, temporariamente, de uma "visão externa" da vida. Como se fossemos retirados de nossa própria existência, a fim de enxergamos ela "do lado de fora".

À nossa minha frente vejo eu mesmo, encarando duas vertentes, dois caminhos a serem seguidos. Em um deles eu posso vislumbrar as possíveis mudanças que conseqüentemente virão caso o escolha. Novas experiências, novos prazeres, novas chances de mudar não só minha maneira de viver, como minha forma de ser. Mudar não apenas o que pode ser visto à minha volta, mas o que pode ser sentido em meu interior, com relação a eu mesmo.

Também vejo as pessoas que provavelmente encontrarei, e as possíveis formas através das quais elas irão influenciar minha vida, tanto para o bem, quanto para o mau. As conquistas que poderei alcançar quando me ver diante delas, e as próximas escolhas, talvez tão importantes quanto esta, que certamente deverei fazer.

Acabo encontrando quase que um novo mundo, uma nova vida, e até mesmo um novo eu, ao olhar para aquele caminho que se encontra à minha frente.

Mas, não poderia deixar de olhar a outra ramificação que está ali, diante de mim. Nela eu não vejo nada de novo, nenhuma mudança, nenhum experiência nova, nenhum prazer que eu já não tenha sentido, nem novas chances de mudar minha maneira de viver e de ser. É o completo oposto do que encontrara no outro caminho. É a estaticidade, a estabilidade. Tudo aquilo que a vida não é, e nunca deveria ser.

Porém, nesse caminho encontro também algo bastante tentador: conforto.

Talvez, me sentir confortável com aquilo que eu tenho, com a forma como eu vivo, seja a única coisa que eu quero. Mas seria isso certo? Ficar parado, vivendo uma vida que se mantém sempre a mesma a cada dia? Sem a menor preocupação, e sem a mínima ambição?

Pode ser uma forma de demonstrar que eu sou um cara que não gosta da correria do dia-a-dia, da ganância que envenena as mentes de boa parte dos seres humanos hoje em dia. Da ambição doentia que os move em um caminho pelo qual, quase que inevitavelmente, acabam deixando um rastro de sofrimento e dor.

Só que, o conforto que tanto desejo acaba sendo parte integrante da vida, e a esta, como já foi dito, não é estática e muito menos estável. Portanto, o conforto é algo que jamais irá perdurar por muito tempo. Uma hora ele irá terminar, as mudanças virão, e dessa vez sem opção de escolha.

E, geralmente quando esperamos que as mudanças venham, ao invés de correr atrás delas, o resultado nem sempre é de nosso grado. Dificilmente se mostra como aquilo que gostaríamos que acontecesse conosco. Pq esse tipo de mudança, aquela que esperamos acontecer, ao invés de fazer acontecer, na maioria das vezes vêm mais como um aviso, e até mesmo uma punição. É mais uma forma de nos mostrar o quanto erramos ao deixarmos passar a chance que tivemos de mudarmos nossas vidas, por nossa conta e risco.

E é o risco o outro fator que acaba falando mais alto na hora de escolher um dos dois caminhos.

O da estaticidade e ociosidade não representa risco algum, pois estaremos lidando com aquilo que estamos acostumados a enfrentar.

Já o outro, mais caótico e instável, é lotado de riscos a serem corridos. Mas, ao mesmo tempo em que podemos sofrer muito no decorrer deste caminho, também existe sempre a chance de passarmos por alguns dos momentos mais inesquecíveis, intensos e prazerosos de nossas vidas. E é isso que faz a diferença aqui. É essa oportunidade de termos o que tanto desejamos que nos faz correr atrás de um caminho que justifique nossas vidas. Que faça delas aquilo que elas de fato são: vida.

E aqui eu digo que prefiro deixar que o caos siga sua ordem, do que a esta venha a dominá-lo, e tudo volte ao ponto de partida. Ao estático, ao estável, ao simples...


Aqui me desanexo...

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