domingo, 20 de setembro de 2009

[CRÍTICA] Anticristo (2009)

Photobucket

Sexo. Loucura. Luto. Tristeza. Razão. Emoção. Terror. Violência. Solidão. Medo.

Estas são algumas palavras que me ocorrem num primeiro momento ao pensar em Anticristo, o novo filme de Lars Von Trier, estrelado por Willem Dafoe e Charlotte Gainsbourg.

Confesso que li umas três críticas a respeito dele antes de assisti-lo, o que contribuiu para diminuir o impacto que ele teria sobre mim caso permanecesse como um telespectador desavisado. Mas, ainda assim, era um filme que estava ansioso pra conferir, por tratar-se de uma produção artística cuja principal intenção é provocar e, até certo ponto, chocar quem assiste, algo que aprecio muito em qualquer filme.

Anticristo, pra quem ainda não sabe (o que é meio difícil, dada a cobertura que o filme recebeu da imprensa), conta a história de um casal que enfrenta a dor da perda de seu filho, cuja morte ocorreu sob circunstâncias um tanto "inusitadas".

Photobucket

A seqüência que abre o filme, quase unanimemente considera uma pequena obra-prima de Lars Von Trier, pela forma poética em que foi filmada, dá conta de apresentar a tragédia do casal, e o tom da história, e do que virá pela frente. Traz algumas das imagens mais belas que já assisti num filme, mesmo exibindo cenas tão sexualmente explícitas, o diretor conseguiu torná-las mais eróticas do que pornográficas. E assistir aquilo tudo embalado por Lascia ch’io Pianga, de Händel, é de causar arrepios!

Dali pra frente acompanhamos todo o intenso tratamento ao qual o marido, um psicólogo, submete a mulher, forçando-a a encarar de frente seus próprios medos sem a ajuda de remédios calmantes e anti-depressivos. Logo ele descobre que uma das maiores fontes de medo da esposa é uma cabana no meio de uma floresta apelidada de Éden, e parte com ela pro lugar, onde a fase mais dramática do tratamento terá início.

Anticristo é um filme cheio de simbolismos, dos mais sutis, como na cena em que ela deita-se na grama numa posição bastante sugestiva, embora não totalmente escancarada, aos mais explícitos, como na grafia usada para escrever o título, ou ainda a automutilação punitiva como forma da personagem eliminar sua "culpa".

Photobucket

Também é um filme de cenas fortes e afirmações polêmicas ("A Natureza é a Igreja de Satã", "O Caos Reina", entre outras). Cenas de sexo e violência explícitos causam grande desconforto em quem o assiste, o que foi um dos motivos de muita gente não conseguir chegar ao final nas exibições de cinema.

É também uma história que estabelece contrastes ousados entre conceitos superficialmente contraditórios. Por exemplo, nascimento e morte são intimamente relacionados, através de imagens como o filhote natimorto de cervo dependurado na vagina da mãe, a raposa morta afirmando que "o caos reina", o filhote de corvo morto a pedradas, o filhote de pássaro sendo devorado vivo por formigas, e depois por um falcão.

A própria cena de abertura funciona com um conflito de conceitos como sexo, prazer e morte. Perda da inocência.

O prazer, aliás, é um dos temas mais recorrentes de Anticristo. É especialmente tratado como a forma que ela encontra de sentir-se viva, ou de esquecer a culpa, o remorso e a dor da perda.

Muitos consideraram a visão negativa e demonizada que o filme apresenta das mulheres como uma tese de idéias defendidas por Von Trier, mas eu a vejo mais como uma forma de ilustrar quão perturbada a esposa se deixou ficar por seus objetos de estudo (ela estudava a história dos atos de barbárie cometidos contra as mulheres na história da humanidade), permitindo que influenciassem na forma como opta por lidar com suas carências afetivas.

Sua visão perturbadora e atemorizante da natureza é a maneira que encontra de transferir sua culpa pessoal para algo que enxerga erroneamente como externo, e maior o suficiente pra sentir-se vítima de tal força (o "Satã/Natureza", que num primeiro momento ela tanto teme).

Photobucket

Além de trazer diversas seqüências plasticamente belas (ela caminhando pela floresta em hiper slow-motion, ele sob a chuva de sementes de carvalho) e perturbadoras (a automutilação genital, as mortes cruas dos animais), Anticristo ainda possui uma narrativa inteligente que, na medida certa, e sem aviso, oferece novas peças do passado dos personagens, aumentando um pouco mais nossa compreensão das motivações mais profundas responsáveis por compor a situação em que se encontram no presente.

É um filme difícil de digerir, mais voltado para a emoção do que para a razão, que em nenhum momento oferece respostas mastigadas ao espectador.

Photobucket

Eu o definiria como um filme sobre a confusão e o caos que impera na mente de uma pessoa incapaz de lidar com suas carências emocionais e afetivas, e seus sentimentos conflitivos. Mas ainda assim isto não diz o suficiente a seu respeito.

Para aqueles dispostos a compreendê-lo por completo, é um filme a ser revisitado diversas vezes. Von Trier novamente conseguiu causar incômodo e levar seu público a reflexões sobre a natureza humana, esta sim a principal fonte do terror que impera em seu Anticristo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário