sexta-feira, 25 de setembro de 2009

[REVIEW] A Marvel fora da Invasão Secreta - Parte 2: Thor

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Continuando a série de textos sobre os heróis da Marvel cujos títulos regulares foram poupados da obrigação de entrar na onda da Invasão Secreta, neste falarei da fase atual de Thor, o Deus do Trovão.

Antes cabe uma breve recapitulação:

Em 2004 rolou a saga Vingadores - A Queda, republicada ano passado num encadernado pela Panini. Nela a equipe de super-heróis passava pelo pior dia de suas vidas. Muitas tragédias rolaram, Homem-Formiga, Visão e Gavião Arqueiro morreram, a Feiticeira Escarlate se revelou a culpada pela bagunça, que no final da história ficou louca, e foi passar uma temporada de repouso supervisionado pelo o papai Magneto e o maninho Mercúrio na devastada Genosha.

O que o Thor teve a ver com tudo isto? Nada, na verdade. Paralelo às desgraças que seus companheiros enfrentavam por conta da piração da Feiticeira Escarlate, em Asgard estava rolando "apenas" o Ragnarok, também conhecido como Crepúsculo dos Deuses Nórdicos, ou simplesmente, "Rapa fora, Thor, que já deu!"

Não li esta saga, mas sei que depois de muita batalha, muitos gritos e ranger de dentes, todos os deuses nórdicos, incluindo Thor, "se murio!", e foram mandados para o Vazio, o lugar para o qual as divindades asgardianas vão quando deixam de existir (sim, soa um tanto contraditório).

Daí que passou pouco mais de 3 anos e resolveram dar uma nova chance pro Deus do Trovão. Botaram a tarefa de ressuscitá-lo nas mãos de Joseph Michael Straczynski (nome imponente, não?), nos roteiros, e Oliver Coipel, nos desenhos. O primeiro já nos brindou com a ótima Poder Supremo, uma versão mais sombria e "realista" da Liga da Justiça, com o porém de ser publicada pela Marvel (!). O segundo foi o competente desenhista da saga Dinastia M, uma conseqüência direta de Vingadores - A Queda, onde a loucura da Feiticeira Escarlate chega ao ponto em que ela simplesmente dá uma repaginada NO MUNDO, e bota os mutantes como espécie dominante, e Magneto como o imperador da Terra (enfim, uma versão melhor escrita da saga Era do Apocalipse, de 1995, com o porém que desta vez quem mandava no pedaço era o Mestre do Magnetismo...).

De início o que chama a atenção na primeira história da dupla criativa é a idéia de que o Vazio não é uma dimensão à parte de qualquer outra, mas as profundezes abissais dos corações humanos. Com o Ragnarok os deuses asgardianos caíram, cada qual, num "vazio" diferente. Assim, Straczinsky delegou aos mortais a tarefa de permitir, ou não, o retorno dos deuses. É um conceito interessante, que remete tanto às idéias de C. G. Jung, sobre inconsciente coletivo e arquétipos, como à questão da origem da criatividade humana e da própria idéia de deuses como criações do ser humano, e não o oposto.

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Blake e Thor novamente vinculados

É uma abordagem criativa, pois Straczinsky embarcou no universo mitológico do personagem quando tudo que fora previsto na mitologia original já havia ocorrido com a versão super-heróica do deus nórdico. O Ragnarok era o único evento que restava, e quando finalmente aconteceu a situação tornou-se ainda mais complicada pro escritor que viesse a trabalhar com o personagem. Diante disto, sua preferência por uma nova abordagem, e a reformulação da mitologia asgardiana foi uma decisão acertada e revigorante.

Assim, os deuses asgardianos agora se encontram na mesma situação em que Thor se viu em diversas fases de sua vida: dependendo de um mortal para se manifestar na Terra, servindo de "canal" entre o plano divino e o mundano, com o porém de que, no caso dos demais deuses e divindades, é Thor quem decide quando vão se manifestar, e não seus "hospedeiros", como ocorre com Donald Blake, o médico que abriga em si a essência do Deus do Trovão.


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Ele podia escolher quais deuses voltariam a existir,
mas no final das contas acabou liberando geral. Tsc tsc tsc...

A reforma no papel dos deuses nórdicos também afetou a natureza de Asgard, seu reino, que agora não mais existe num outro plano dimensional, mas numa réplica mais "modesta" construída a partir de um naco do deserto de Oklahoma, sobre o qual fica pairando, de forma mais contemplativa do que imponente. É tempo dos deuses refletirem sobre seu papel nesta nova posição que ocupam.

Outra idéia bacana é a interação que esta abordagem mais "pé no chão" permitiu existir entre os deuses e os mortais, que até o momento foram representados pelos habitantes pacatos e simplórios de Oklahoma City. O melhor episódio até agora foi o do rapaz apaixonado pela deusa Kelda, uma beldade, que se afeiçoa pelo sortudo e o convida a fazer uma visita a Asgard. A cena em que ele tenta ensinar um bando de guerreiros asgardianos a jogar basquete é hilária!

Outro ponto a favor é a sacada de Loki ter "reencarnado" em uma mulher, tornando-se um mistério até que ponto tal mudança afetou seu caráter, isto até que comece a posar de boa samaritana, e a manipular as opiniões de alguns deuses a respeito da atual condição de Asgard fazendo uso de sua atual persona sedutora.

É também notável a maneira compassada com que Straczynski vem conduzindo a história. Sem a preocupação de trazer em todas as edições grandes combates e partir logo de um acontecimento marcante pra outro, a cadência mais suave com que tudo ocorre contribui na tarefa de realçar a sensação de que trata-se de uma fase mais reflexiva na vida daqueles personagens. Mas isto não o impediu de imprimir uma crescente inquietude que, a cada história, torna mais nítida a idéia de que algo grande está prestes a ocorrer, algo que aos poucos vem sendo preparado por debaixo dos panos. Toda a primeira edição, unicamente dedicada ao retorno de Thor, e a segunda, que mostra a reconstrução de Asgard, são ótimos exemplos de como escrever boas histórias a partir de uma idéia simples, e sem a necessidade de criar inúmeras sub-tramas pra prender a atenção do leitor até o mês seguinte.


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E finalmente... Asgard!


Claro que uma abordagem um tanto fora do convencional, no que diz respeito a quadrinhos de super-heróis, pedia um desenhista que se adaptasse à tarefa, e felizmente Straczynski teve a felicidade de conseguir Oliver Coipel para o trabalho. Um artista que apurou seu estilo desde seu trabalho em Dinastia M (o último antes deste que pude conferir). Usando um traço mais limpo, de linhas finas, econômicas e expressivas, suas figuras humanas são estilizadas mas sem cair em excessos e exageros, e soam muito naturais. Há ainda um tom épico em sua forma de contrastar os personagens e os cenários onde se encontram, e nota-se uma sutil influencia européia em sua maneira de conduzir a narrativa, especialmente na forma elegante com que desenha os vestuários dos personagens, e a forma como retrata a ação.

Straczinsky ainda consegue surpreender o leitor brincando e subvertendo clichês do gênero. Na terceira edição, quando Thor se encontra com o Homem de Ferro, após descobrir que o herói fora um dos responsáveis por cloná-lo e usar seu clone durante a Guerra Civil, que por sua vez foi responsável pela morte do Golias, era de se esperar mais um dos típicos quebra-paus entre os dois heróis. Mas o escritor, conhecendo a natureza de seu personagem, e lidando justamente com a idéia de que a estadia de Thor no Vazio deu-lhe tempo o bastante pra refletir sobre sua antiga agressividade e impulvidade, faz o Deus do Trovão dar uma baita lição de moral no Homem de Ferro, e colocá-lo em seu devido lugar, como um mero mortal dentro de uma armadura tecnológica que nem chegaria perto de dar conta de um acesso de fúria do loirão e seu Mjolnir. A parte física da coisa resume-se a um baita choque atordoante que Thor aplica no Homem de Ferro, apenas pra imobilizá-lo e calar sua boca e sua arrogância. Já estava na hora de ele ouvir um pouco. Afinal, quem mandou ele mexer com um deus?


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Cala a boca e me escuta!
(...) Gamei em você!


É de idéias simples e renovadoras como estas que os quadrinhos de super-heróis precisam. Felizmente ainda há caras como Straczinsky e Coipel pra nos oferecer um pouco de novos ares neste gênero que a cada ano nos entrega mais autoplágios do que ousadias.

Thor vem sendo publicado no Brasil pela Panini na revista Os Novos Vingadores, desde a edição 53.

P.S.: a partir da edição 67 a Panini deu uma pausa na fase escrita por Straczynski para a publicação da mini-série Secret Invasion: Thor, com histórias de Matt Fraction (de Punho de Ferro, série sobre a qual pretendo escrever em breve), e desenhos de Doug Braithwaite (da excelente maxi-série Justiça, publicada pela DC Comics) ligada à saga Invasão Secreta, que de início se mostrou interessante, embora soasse como uma quebra no ritmo e nas idéias desenvolvidas pelo escritor anterior. Mas, como a saga termina em dezembro, creio que logo em seguida veremos o retorno da dupla criativa ao personagem.

Até a próxima parte, quando elucubrarei a respeito da atual fase do Homem de Ferro. Aguarde e confie!


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E TENHO DITO!!

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